Isabel Pires
Chama-se Vera Lúcia. Tem uma grande barriga e pernas
fininhas e braços também e cinco anos incompletos de idade. E tem uma mãe que
tem dez filhos e um olho cego.
— Eu tenho um nenê.
— É?!
— Você já viu ele?
Outro
dia ela fez um belo desenho. Representava uma barata gigantesca tendo filhotes.
E outro desenho ainda: “patinhos dentro de um homem”.
—
Você sabe onde eu moro?
—
Hã-hã.
—
Hoje é meu aniversário.
—
É?!
Todo
dia era seu aniversário, mas infinitamente ela nunca ultrapassava os cinco anos
incompletos de idade. E tinha um nenê.
—
Você já viu ele?
—
Quem?
—
O meu nenê.
O
bebê sempre vinha no colo da mãe.
—
Mas é meu. Minha mãe teve ele pra mim – ela afirmava, balançando a cabeça e
sacudindo decidida o fio fino do queixo.
A
barriga dela, grande, aumentava de tamanho depois da sopa.
—
Quero mais.
Raspava
o fundo do prato, buscando a última gota.
—
Quer mais?
Balançava
a cabeça e os pés, suspensos sob o vão da cadeira. O segundo prato vinha,
fumegante.
—
Quer mais?!
No
pátio, a barriga crescida, ela sentava no banco de cimento, as perninhas
cruzadas. Súbito:
—
Quero ir ao banheiro.
—
Já?!
A
mãe vinha, o bebê no colo, o olho velado procurando a menina entre as outras
crianças.
—
Vam’bora Verinha.
Verinha
batia palmas, dando risadinhas saltitantes.
—
Olha lá meu nenê. Tá no colo da minha mãe, mas é meu!
***
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