quinta-feira, 15 de dezembro de 2022

De epígrafes e epitáfios

 

Isabel Pires

My heart,

 

Sinto saudades. Não falo de uma saudade literária, menos ainda de saudades abstratas. Creio que você sabe muito bem o que quero dizer. Falo dessa coisa concreta que chega a doer e que, no meu caso, deixa mais cinza o carpete sob meus pés.

Lembra da última vez que nos vimos? Havia chovido há pouco, e havia um arco-íris com pontas que se enterravam nos telhados de zinco dos barracos que a gente via da janela do décimo primeiro andar, e você comentou “como é bela a paisagem”. Não pude perceber a paisagem a que você se referia, porque, eu, só conseguia ver os barracos. A diferença entre ver a coisa-em-si e ver para além da coisa. Quer um exemplo literário? (já que a vida é feita de referências literárias...)

“Caímos no canapé, e ficamos a olhar para o ar. Minto; ela olhava para o chão. Fiz o mesmo, logo que a vi assim... Mas eu creio que Capitu olhava para dentro de si mesma enquanto eu fitava deveras o chão” (página? ?)

Não, não estou te cobrando os livros. Pode ficar mais um tempo com eles. É que apenas gosto demais das ambiguidades machadianas. Tá bom, eles me fazem um pouquinho de falta, sim, mas não estou com saudade deles não...

Ontem à noite fomos, eu e Sassá, à casa de Carol comer lasanha, que aliás estava uma delícia. Sassá entusiasmou-se e fez discurso em homenagem às lasanhas. Bebeu muito vinho e, como sempre, estragou tudo. Até o discurso em homenagem à lasanha, que ele vomitou no tapete verde da sala da Carol. Digo, vomitou a lasanha, literalmente. Dá para acreditar que ele tem amnésia alcoólica?

Continuo esperando tua resposta sobre a nossa viagem no final do ano. A galera toda vai. A Cidinha, o Vitinho, Neusa, Fernando, Mônica. O Eduardo, a Simone. Até o Sassá. E os dois Gustavos. Aviso que a viagem é bem longa. Vê se dá notícias concretas. Nada de “o que ficar resolvido tá bom”. Precisamos nos falar.  

Lembra dos textos que vão ser publicados em livro? Só de “autores inéditos”? Parece ironia. Você mesmo disse uma vez que, à essa altura, ninguém pode mesmo ter ideias originais, e que tudo acaba se resumindo a um interminável trabalho de copia-e-cola. Mas citar o trabalho de um autor como se fosse de outro? A boa notícia é que o livro vai sair. Mesmo.

Ah, outra coisa: coloquei de última hora uma epígrafe no meu texto (mais um copia-e-cola hehe!). Depois, li um artigo que faz uma aproximação – um tanto forçada, é verdade – entre epígrafes e epitáfios. Ai, meu texto!

 

 

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