Isabel Pires
A diretora enfiou a
cara na porta da sala e comunicou à professora, de pé, em frente à turminha:
—
O Marciano está na Baleia.
A
professora mesmo custou a entender. Depois, balançou a cabeça afirmativamente.
Estava certo.
A
turma, entre seis e sete anos de idade, nada entendeu. E uma garotinha, de
olhos arregalados, perguntou:
—
Tia, quê que teve com o Marciano?
A
tia apenas repetiu:
—
O Marciano está na Baleia.
—
Na baleia??
A
gurizada, contente com a mágica, começou a cantarolar:
—
O Marciano está na baleia! O Marciano está na baleia!
A
tia pegou lápis e papel e, rodeada pelas crianças, desenhou: uma baleia
simpática, com seu tradicional espirro de água parecendo árvore e um olhar
maroto de quem realmente entendia de engolir pessoas. Pois já não tinha a
experiência do sabor do Jonas?
—
Cadê o Marciano? – cobraram as crianças.
A
tia pensou e resolveu: iria desenhar uma baleia esquemática, para que todos
vissem o Marciano bem instalado no seu barrigão. Desenhou, pois, uma figurinha
barriguda e de muitos dedos e de cabelo cacheadinho e de olhos assustados
dentro da barriga da baleia. Era o Marciano.
—
A baleia engoliu o Marciano? – perguntaram meio alarmados e meio surpresos
vários garotos.
—
Hum-hum – confirmou a tia, divertida com a ideia.
A
criançada pulava e cantarolava:
—
A baleia engoliu o Marciano! A baleia engoliu o Marciano!
Para
eles, era baleia com “b” minúsculo mesmo, pois embora nunca tivessem visto uma
baleia de verdade, conheciam a história do peixe enorme, engolidor de jonas
desprevenidos. Somente a professora e a diretora sabiam: era Baleia com “B”
maiúsculo.
Mas
a turminha, inteirada da história de Jonas, cobrou:
—
Tia, quando é que a baleia vai desengolir o Marciano?
—
Ah! Só quando ela comer o dedinho dele, aí ele sai de dentro da barriga dela!
Para
não restar dúvida de que a baleia “desengoliria” o Marciano, a tia voltou ao
primeiro desenho: fez o Marciano sentado, em cima do espirro de água da baleia,
com um sorriso no rosto e cinco dedos em cada mão e em cada pé.
A
turma não cabia em si de contente. E na hora do lanche, quando foram comer,
lembraram que também a baleia comeria – o quê? – os dedinhos excedentes dos pés
e das mãos do Marciano. Cantarolavam ritmadamente, satisfeitos com a comida:
—
A baleia engoliu o Marciano! A baleia engoliu o Marciano!
E
depois:
—
A baleia vai desengolir o Marciano! A baleia vai desengolir o Marciano!
Era,
porém, proibido fazer bagunça na hora da merenda. E a diretora em pessoa veio
impor silêncio aos pirralhos. Que história era aquela de baleia?
—
Tia, a baleia engoliu o Marciano! – disse uma garotinha que ainda não sabia
distinguir uma “tia” de uma diretora. – E – continuou ela – só vai desengolir
quando comer os dedinhos dele.
A
diretora entendeu tudo. Sem piedade, esclareceu a turma:
—
Não, não é nada disso não. Baleia é um hospital que fica em Belo Horizonte, capital
de Minas Gerais. E o Marciano foi lá para operar as mãozinhas e os pés.
Saiu, abanando a cabeça, reprovando intimamente a professora. Mas esta, vingando-se, deu-lhe língua pelas costas e a turminha então estourou numa gostosa gargalhada.
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